A angústia do guarda-redes perante o penalty é um espectáculo que visita várias territórios das artes performativas. Um trabalho pluri(trans)disciplinar em que o teatro, o movimento, o vídeo, a luz, a música e as artes plásticas se combinam. Uma experiência artística a que chamamos instalação vídeo-teatral, onde e(in)vocamos Leonardo, Goya e Münch. O Holocausto e o Vietname. Do Antigo Egipto aos Maoris. Pinturas, fotografias, memórias e acontecimentos que marcam este mundo em que vivemos.
Uma montra com o interior todo negro, à excepção do chão branco. Luz. Ao fundo recorte da silhueta de uma baliza, de um branco imaculado. Em cada canto da montra um televisor transmitindo imagens de futebol, acontecimentos diversos e espectáculos teatrais. Um homem nu que guarda a baliza. O guarda-redes segue com os olhos e o corpo o decorrer do jogo. Há atenção, tensão, distensão nos seus movimentos...
A bola está longe, do outro lado do campo. Os pensamentos voam desordenados e chegam-lhe imagens, ecos de memórias, fragmentos de outras vidas que o corpo projecta em movimentos que se multiplicam. A bola aproxima-se da baliza e ele volta ao jogo. Um apito estridente soa. É penalty. Ele é o guardião, o responsável pela inviolabilidade do seu grupo. O homem da fronteira, intransponível para os outros. Ele é agora o último dos homens...
Prescindindo das palavras, o actor - o corpo do actor - deambula pelo espaço fechado, gesto a gesto, movimento a movimento. E(in)voca factos e acontecimentos que fizeram a história da humanidade. A angústia do guarda-redes perante o penalty é a angústia do homem diante da vida e do momento que lhe é dado viver.
O espectador que, passeando pela rua, olha a montra onde dois televisores passam imagens sobre futebol, acontecimentos diversos e de espectáculos teatrais, não dispõe de palavras para descodificar a acção, durante os cerca de vinte minutos em que decorre este espectáculo. Perante ele, um homem vivo em movimento, música e imagem, muitas imagens, nos televisores. - José Leitão